O cenário político brasileiro, ainda mais conturbado pelo início do processo sobre a possibilidade de impeachment da presidente da República, não pode sucumbir às armadilhas das radicalizações. Alguns gestos são preocupantes. Ao despir o capote de chantagista e detonar seu cinto-bomba, o deputado Eduardo Cunha provocou reação igualmente irracional de parte de lideranças petistas, que já ameaçam chamar os movimentos sociais para as ruas. Embora a pressão popular seja parte legítima da democracia, há que se ter cuidado com incitações e com radicalismos, que sempre podem piorar o que já está ruim.
É compreensível que os governistas e setores que os apoiam acusem o parlamentar de abrir o processo contra a presidente como retaliação. Mas não haverá contribuição à democracia, por parte dos contrariados com a decisão, se o estímulo às manifestações de rua incluir a desobediência a normas e leis e a incitação ao confronto em espaços públicos, como já ocorreu em atos dos últimos anos. Experiências recentes, em que o radicalismo superou o bom senso, não recomendam a elevação do tom de líderes políticos e de movimentos sociais, sob pena de tumultuar ainda mais os desdobramentos do embate entre governo e oposição. Também estão equivocados os que contribuem com a radicalização ao trocarem ofensas e acusações, como fizeram o próprio Cunha e o ministro-chefe da Casa Civil, Jaques Wagner.
A liberdade de expressão, especialmente em momentos como este, deve ser assegurada a todas as partes, para que, a partir do debate, sejam estabelecidas as bases para que todos, e não só o Congresso e o governo, possam formar opinião. Mas não é recomendável que, sob o pretexto da defesa de pontos de vista, alguns setores se sintam autorizados a exorbitar desse direito. Grupos pró e contra o impeachment poderão testar a capacidade de convencimento de suas convicções, desde que respeitem os limites da discordância em uma democracia.
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