Certamente você, altaneiro leitor, já percebeu que suguei o título desta crônica noutra de Rubem Braga: “Ai de ti, Copacabana”. É meu cronista predileto, perto dele sou um escrevinhador de meia-pataca. Confesso que me sinto desconfortável em dizer que sou cronista. Braga fala de sua tristeza em ver o progresso engolindo a beleza bucólica de uma Copacabana que ele presenciou; inclusive, enfurecido, puxa a orelha de Copacabana figurativamente: “Pinta-te qual mulher pública e coloca todas as tuas joias e aviva o verniz de tuas unhas e canta a tua última canção pecaminosa…”. Já eu falo da minha tristeza em ver a destruição por que passa o Parque Estadual Altamiro de Moura Pacheco em decorrência de incêndios que acontecem todos os anos.
Pior que ler e assistir às matérias sobre incêndios de grandes proporções que todo ano destroem o parque é passar na BR que o corta no trecho entre Goiânia e Terezópolis de Goiás e ver de perto milhares de carcaças de árvores mortas. Hefestos, deus do fogo que ficou coxo e deformado após ser lançado por Zeus do alto do Olimpo, está com suas chamas ligadas no 12. Há incêndios ocorrendo em alguns estados. E os noticiários dizem que Polícia Federal está na captura de supostos criminosos. A causa desses crimes precisa ser explicada e a pena aplicada com rigor da lei. A PF precisa morder a jugular desses criminosos com força.
Ouvi no restaurante enquanto almoçava, isso no domingo, que agosto é o mês do desgosto, relato relacionado aos incêndios diversos no país. A mulher próxima à minha mesa chegou a citar algumas mortes ocorridas no referido mês: o suicídio do presidente Getúlio Vargas em 24 de 1954, a morte de Juscelino Kubitschek num misterioso acidente automobilístico em 22 de 1976. A morte de 200 mil pessoas em Hiroshima e Nagasaki, em 1945, nos dias 6 e 9 em decorrência de bombas atômicas americanas, também entrou na exemplificação funesta da mulher.
Senti vontade de fazer uma observação à mulher, dizendo-lhe que agosto é também tempo da florada de ipês, cega-machados, mangueiras… Convenci-me a ficar calado. Não dei aos porcos as pérolas. Fiz destas um colar para adorno do meu silêncio. E outra que a conversa não era comigo. Sou pé atrás com essas superstições. O fato de o homem ter morado em cavernas e nem conhecer o calendário é que sustenta a minha incredulidade. Agosto é nome que homenageia o imperador Cézar Augusto, que governou Roma entre 27 a.C. a 14 d.C. Sextilis era o nome anterior de agosto por ser o sexto mês do ano, que ainda não era de 12 como agora. Júlio César, o todo poderoso, também meteu o bedelho no calendário — emplacou julho —, no entanto, numa visita que fez ao Senado em 15 de março de 44 a.C., quando estava no esplendor de popularidade e prestígio militar, não teve como conter a fúria dos punhais dos senadores, entre os quais estava seu sobrinho Brutus, que, perseguido, acabou se suicidando dois anos depois.
E por trás dessas árvores mortas no Parque Estadual Altamiro de Moura Pacheco, estão também outras mortes de variadas espécies de animais que vivem naquele habitat. Nas letras mortas em partes da nossa Constituição, mais precisamente no artigo 225, há palavras perfumadas em favor do meio ambiente, dentro do qual estão plantas e bichos: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. As palavras das leis poderiam ser como as dos poemas, que saem do papel e leva o leitor para voar. Muitas de nossas leis por fora são bela viola e por dentro pão bolorento…
Por lá os incêndios têm sido sempre de grandes proporções. Arrisco a dizer que esses incêndios poderiam ser contidos se houvesse aprimoramento na técnica de combate. O procedimento de sempre é tacanho: o uso de soldados do Corpo de Bombeiros, que muitas vezes chegam aos focos de incêndio com certo sacrifício pelo fato de impedimento de acesso dos veículos da corporação. O que exige que os soldados marchem a pé o local. E, quando chegam, o fogo já avançou muito mata adentro.
A solução para tal problema não necessita de uso IA, basta apenas uma maior sensibilidade ambiental do poder público para com o parque. A aquisição de um helicóptero resolveria o problema com maior facilidade, pois água há em abundância no Reservatório João Leite: uma caixa d´água com 129 bilhões de litros, da qual nos servimos diariamente além das águas do Meia Ponte, um rio em agonia. O recurso para compra da aeronave poderia, por exemplo, sair das misteriosas emendas PIX, ou até mesmo do Fundo Estadual de Infraestrutura, haja vista que, do ribeirão João Leite, ocorre captação de água para agricultura, pecuária e sobretudo para abastecimento humano.
Sinésio Dioliveira é jornalista, poeta e fotógrafo da natureza
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